Ressurgimento da pólio deixa especialistas em alerta
- Giselle Aguiar Pires
- 9 de set. de 2022
- 4 min de leitura
A poliomielite é uma doença infectocontagiosa aguda que pode provocar desde sintomas leves, como os de um resfriado comum, até problemas graves no sistema nervoso, como paralisia irreversível, especialmente em crianças com menos de cinco anos de idade

Publicado no periódico médico JAMA, publicação da Associação Médica Americana, no último dia 25 de agosto, o artigo What All Physicians Need to Know About the Polio Resurgence in New York State (O que todos os médicos precisam saber sobre o ressurgimento da pólio no Estado de Nova Iorque) faz um alerta sobre a volta da poliomielite. O alerta aconteceu com a confirmação do diagnóstico em um jovem adulto na cidade de Rockland, região de Nova Iorque, o primeiro desde 2013.
O paciente não havia sido vacinado e não viajou para nenhuma região na qual a pólio seja um risco. Isso significa que o vírus está circulando localmente, de acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, o CDC, órgão equivalente ao Ministério da Saúde no Brasil.
A poliomielite é uma doença infectocontagiosa aguda causada pelo poliovírus selvagem. Em cerca de 25% dos casos, é assintomática ou causa sintomas leves como os de um resfriado comum.
No entanto, de 1% a 5% das pessoas com a infecção desenvolvem meningite. Neste caso, é possível que a infecção atinja a medula espinhal, levando à paralisia. Outros podem ter graves problemas respiratórios, que podem levar à morte. Os casos mais graves representam cerca de 0,05% a 0,5% dos infectados.
Neste caso descrito no artigo, o paciente teve paralisia. De acordo com o CDC, estatisticamente, isso significa que pode haver 100 pessoas ou mais na região sem sintomas. A hipótese da circulação comunitária foi reforçada após detectarem o poliovírus em várias amostras de águas residuais coletadas na região.
Além dos Estados Unidos, já foram registrados casos de poliomielite em Israel e no Malaui. Neste último, já foi declarado pelo governo local um surto de poliomielite selvagem. No Afeganistão e Paquistão, países que jamais conseguiram erradicar a poliomielite, a situação é considerada endêmica.
Baixa adesão à vacina: uma epidemia global
O caso de paralisia decorrente de poliomielite não é surpreendente, infelizmente. O paciente reside em uma área com baixa taxa de vacinação contra a doença. De acordo com o governo norte-americano, apenas cerca de 60% das crianças de 2 anos haviam recebido as 3 doses recomendadas da vacina inativada contra o poliovírus (IPV). Em algumas regiões, a taxa foi de apenas 37%, enquanto a média estadual esteve em 79%.
A vacinação contra a poliomielite previne que indivíduos desenvolvam a poliomielite sintomática. Esta é a única forma de prevenção, já que não existem tratamentos antivirais ou outros para a doença.
Pólio no Brasil
O Brasil não detecta casos de poliomielite desde 1989. Por este motivo, juntamente com outros países das Américas, recebeu o certificado de Área Livre de Circulação do Poliovírus Selvagem da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), vinculada à Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1994.
No entanto, desde 2015 o Brasil não cumpre a meta de 95% do público-alvo vacinado, patamar necessário para que a população seja considerada protegida contra a doença.
No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece dois tipos de vacina para a imunização da pólio: inativada e atenuada. A inativada deve ser aplicada nos bebês aos 2, 4 e 6 meses de vida. Já as doses de reforço são feitas com a vacina atenuada, administrada em gotas por via oral, aos 15 meses e 4 anos de idade.
Segundo o Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), a cobertura vacinal com as três doses iniciais da vacina foi de 67% em 2021. A cobertura das doses de reforço é ainda menor: apenas 52% das crianças receberam o esquema completo.
A importância da vacinação
Para garantir a segurança de uma população, é necessário um histórico completo de vacinação de toda a população, não apenas daqueles que vivem onde o vírus foi detectado. Sem a vacinação completa contra a poliomielite, bebês, crianças e adultos de todas as idades estão em risco de exposição.
Por isso, para quem não tem certeza de ter tomado todas as doses da vacina na infância, é possível realizar um reforço ou um curso completo de 3 doses, garantindo, assim, que todos estejam protegidos.
Pessoas totalmente vacinadas, mesmo em ambientes de alto risco, correm um risco muito baixo de contrair poliomielite e menor ainda de desenvolver problemas graves, como a paralisia.
Por que não vacinar?
Um relatório clínico da Academia Americana de Pediatria (AAP) de 2016 encontrou diferentes motivos para a não vacinação da população dos Estados Unidos. Algumas pessoas acreditam que as vacinas não são mais necessárias, enquanto outras não confiam no sistema de saúde. Segundo o relatório, aqueles que apenas têm preocupações com as vacinas, podem ser persuadidos a se vacinar, o que não ocorre com quem se opõe veementemente. Há, ainda, um terceiro grupo que apenas aceita as vacinas obrigatórias.
É importante lembrar que no início da década de 1950, cerca de 15 mil casos de poliomielite paralítica, que é aquela que pode levar à paralisia total ou parcial dos membros inferiores, ocorriam anualmente nos Estados Unidos.
Com os índices de vacinação em queda, o ressurgimento de doenças como a pólio pode acontecer. Foi o que levou ao surto de sarampo de 2019, que atingiu o condado de Rockland, a mesma região que agora registrou este caso de paralisia por conta da poliomielite nos Estados Unidos.
Diferente do sarampo, o diagnóstico da infecção pelo poliovírus é mais difícil, porque a maioria das pessoas infectadas não apresenta sintomas ou terá sintomas virais inespecíficos, como febre, dor de garganta, cansaço, dor de cabeça, náusea e dor de estômago.
Sintomas da poliomielite
Além dos sintomas virais inespecíficos, a infecção pelo poliovírus pode causar fraqueza nos membros, que progride ao longo de alguns dias, chamada paralisia flácida aguda. Geralmente, o sintoma é pior em um dos lados do corpo e progride dos músculos proximais (localizados mais próximos do tronco) para os distais, sobretudo nas pernas e pés. A força e o tônus muscular são afetados e os reflexos diminuem. Também podem ocorrer dificuldade para falar ou engolir, bem como desconforto respiratório.
A poliomielite deve ser considerada especialmente na ocorrência de registros da doença na região, em pessoas não vacinadas ou com esquema de vacinação incompleto, entre pessoas que realizaram viagens ou estiveram próximas a pessoas de países com alto risco de pólio e, especialmente, em caso de contato com alguém infectado.
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